A acessibilidade digital não é um tema fácil. Podemos olhar para o tópico de forma simplista e acreditar que com um toque aqui e ali conseguiremos resolver o tema nos nossos projetos, mas a prática das equipas está bem longe disso. A acessibilidade digital não pode ser resolvida simplesmente com ou outro add-on tecnológico nos produtos e serviços digitais que construimos e evoluímos todos os dias em equipa.
A acessibilidade digital é uma preocupação que deve estar presente em qualquer projeto de transformação digital, desde o dia 0. Seja nos processos de pesquisa com utilizadores para percebermos o que faz e não faz sentido fazer, no recrutamento da equipa de projeto garantindo que esta se encontra perfeitamente confortável para trabalhar o tópico ou até mesmo nos processos de controlo de qualidade dos entregáveis, tudo isto são momentos onde as preocupações sobre acessibilidade digital, podem e devem estar presentes.
Todos podem contribuir
Apesar de não ser um caminho fácil, o primeiro passo de qualquer metodologia, quer estejamos a definir, desenhar e desenvolver um produto ou serviço digital de raiz ou a evoluir uma solução já existente, é criar no projeto processos de verificação e controlo de qualidade, também no que toca à acessibilidade digital.
Quanto mais este trabalho for feito por profissionais com conhecimentos técnicos, melhor, pois isto garante um maior rigor na análise. Contudo, é importante ter consciência que com mais ou menos conhecimentos técnicos sobre o tema, todas as pessoas na equipa podem contribuir para os processos de verificação. A acessibilidade digital não pode ser uma preocupação exclusiva de determinados profissionais na equipa de projeto.
Diretrizes de referência
Se vamos verificar alguma coisa, temos que perceber antes, quais são os critérios que vão nortear essa verificação. Por outras palavras, vamos verificar como está acessibilidade digital do nosso produto ou serviço digital, segundo o quê? É aqui que entram as Web Content Accessibility Guidelines (WCAG), atualmente na sua versão 2.2. e editadas pelo consórcio W3C.
De forma muito resumida e mais simples ainda, são estas guidelines que definem quais são as directrizes de acessibilidade digital que os produtos e serviços digitais devem seguir. Por conseguinte, algumas das verificações mais elementares que podemos fazer, procuram simplesmente perceber se aquilo que estamos a fazer em cada momento cumpre ou não estas guidelines.
Níveis de conformidade
Sobre as WCAG e ainda numa abordagem bastante introdutória, importa igualmente perceber que estas guidelines definem ainda três níveis de conformidade: A, AA e AAA (sendo o A o mais básico e o AAA o mais robusto). O cumprimento das guidelines, fará com que possamos classificar o nosso produto ou serviço digital conforme, ou não, com um dos três níveis de conformidade descritos nas WCAG.
É ainda importante referir sobre as Web Content Accessibility Guidelines (WCAG), que estas directrizes servem de referência para quase tudo aquilo que é o quadro legislativo sobre acessibilidade digital. Este facto reforça ainda mais a importância e existência destas guidelines para toda a indústria e a sua adoção como padrão para todas as soluções.
Verificações possíveis
Para aferir o nível de conformidade do nosso produto ou serviço digital com as WCAG, poderemos em vários momentos distintos do projeto, realizar diferentes modelos de verificação com mais ou menos profundidade. É importante perceber que a acessibilidade digital, tem muito que ver com a especificade de utilização de pessoas com muitas necessidades diferentes. Quer isto dizer que as guidelines, são isso mesmo, guidelines, mas é fundamental perceber sempre o contexto do projeto e as pessoas para as quais estamos a trabalhar.
Apesar disso, é possível tipificar os tipos de verificações que poderemos fazer em duas grandes tipologias: verificações automáticas e verificações manuais.
Verificações automáticas
As verificações automáticas, analisam através de aplicações informáticas, o cumprimento ou não da solução segundo as diretrizes das WCAG. Estas verificações não requerem grande esforço de análise, devem ser realizadas com base na versão em produção e analisam o código desenvolvido de fio a pavio.
São verificações muito úteis para identificar em cada momento os pontos mais críticos no que toca à acessibilidade digital da solução em produção. Contudo, não são soluções mágicas e importa analisar os seus resultados com cautela. A verificação automática, não dispensa o cruzamento desta análise com outros tipos de verificações.
Alguns exemplos de ferramentas que podem ser utilizadas para a verificação automática de uma solução em produção:
Verificações manuais
Em complemento das verificações automáticas, as verificações manuais, são outro do instrumento que nos pode dar algumas pistas como está a acessibilidade digital da nossa solução. Estas verificações, devem ser realizadas por profissionais com conhecimentos especificos de acessibilidade digital.
Por norma, estas verificações podem complementar as verificações automáticas, sendo ideal não dispensar nenhuma das duas verificações. As verificações automáticas são uma execelente ferramenta para uma verificação rápida e em escala, enquanto as verificações manuais podem ajudar a uma análise mais especifica e ao detalhe. Estas verificações manuais, seguem igualmente as directrizes descritas nas WCAG mas podem também utilizar outro tipo de listas de verificação.
Alguns exemplos de checklists que podem ser utilizadas para a verificação manual de uma solução em produção:
- UX Sapo – acessibilidade
- W3C/WAI Easy Cheks
- Accessibility Not-Checklist
- WebAIM WCAG 2 Checklist
- The A11Y Project – checklist
Testes de usabilidade
A completar estes dois tipos de verificações, é sempre importante nunca descartar a realização de testes de usabilidade com pessoas com diferentes necessidades especiais. Para lá das ferramentas automáticas ou checklists de verificação, a utilização em contexto das pessoas para as quais estamos a trabalhar das soluções que criamos, é sempre a última e derradeira verificação que poderemos fazer.
Fazer testes de usabilidade com pessoas com necessidades especiais, não é um bicho de sete cabeças, segue quase todos os cânones do protocolo de testes de usabilidade convencionais e são experiências extraordinárias de aprendizagem.
Nem tudo é preto e branco
Verificar como está a acessibilidade digital do nosso produto ou serviço digital, está muito longe de ser um exercício linear. É certo que temos à nossa disposição muitas directrizes, fantásticas ferramentas e imensos recursos que a comunidade vai construindo e partilhando. Mas, este é também um exercício de aprendizagem constante.
Não poderemos nunca olhar para qualquer processo de verificação, simplesmente como uma tarefa de compliance. Verificar a acessibilidade digital de uma solução só é importante porque com isto vamos tornar os nossos produtos ou serviços digitais, realmente acessíveis para pessoas com necessidades muito concretas. Este deve ser um processo guiado pela empatia com os nossos utilizadores, mais que a aplicação by-the-book de directrizes.
Fotografia © Glenn Carstens Peters (Unsplash)