Na construção de um produto ou serviço digital, não é difícil encontrar “coisas” para fazer, o difícil sim, é perceber onde deveríamos estar efetivamente a investir o esforço da equipa. Saber “escolher” o que fazer e o que não fazer é provavelmente uma das decisões mais importantes que podemos tomar na gestão de produtos e serviços digitais. Ideias nunca faltam. Tarefas também não, mas quais são aquelas que podem trazer um maior benefício para o negócio com um menor esforço?
Saber responder de forma estruturada e sustentada a esta questão não deve ser algo com que as equipas de projeto se devem preocupar. Deve ser algo com o qual devem ser completamente obcecadas. Obsessão é uma palavra muito forte, é verdade. Mas a importância daquilo que estamos a falar aqui, justifica a força da palavra. Tomar decisões numa estratégia de produto é uma tarefa difícil. Nem sempre acertamos (o que faz parte do processo). Contudo convém que essas decisões também sejam ponderadas, para que consigamos, com a certeza de que vamos falhar algumas vezes (muitas seguramente), possamos errar o menos vezes possível.
Este artigo é uma tradução e adaptação do artigo original The Pareto Principle and Your User Experience Work integrado na parceria de Educational Partner entre a Interaction Design Foundation e o DXD.
Existem 2 coisas sempre escassas em qualquer projeto: tempo e dinheiro. O Princípio de Pareto pode, a longo prazo, ajudar-te a poupar tanto um como o outro. Também te pode ajudar a tomar decisões inteligentes com base na tua user research.
A nossa história começa com o consultor Joseph M Juran, nos anos 1940. Juran notou que existem uma regra geral nos negócios e na vida: 80% dos efeitos de um processo surgem de apenas 20% das causas. A este princípio, Jura chamou Princípio de Pareto, em homenagem ao economista italiano Vilfredo Pareto (1848-1923).
Pareto tinha publicado o “Curso de Economia Política” em 1896. Tinha observado que 80% do território de Itália era detido por 20% da população. Também notou que 20% das vagens de ervilhas no seu jardim continham 80% das ervilhas.
Índice
- A importância deste princípio
- O Princípio de Pareto e UX
- Como aplicar o Princípio de Pareto
- Em resumo
- Referências adicionais
- Sugestões de formação
- Dossiê temático
A importância deste princípio
O Princípio de Pareto é útil porque nos permite focar os nossos esforços nas áreas que nos trazem mais benefícios. É usado em quase todas as disciplinas de negócio. Por exemplo, as pessoas que trabalham em vendas vão notar que 20% das suas contas são responsáveis por 80% das suas vendas. Os marketers vão ver que 20% das suas campanhas geram 80% das suas leads. E por aí fora.
É importante notar que a proporção de 80% para 20% não é exata. Por exemplo, podes aperceber-te de que estes números mudam quando examinares a tua própria situação. No Reino Unido, neste momento, vais ver que 20% da população detém apenas mais de 50% da riqueza da nação (o que dá muito que pensar).
O que é quase sempre verdade é que uma pequena proporção dos esforços (os inputs) vão gerar uma grande parte maior dos resultados do que esperado (os outputs).
O Princípio de Pareto e o UX
Não interessa o quão complexo é o teu site ou aplicação, vais ver que, quando olhares para os dados analíticos, o Princípio de Pareto se aplica. Uma pequena fração das funcionalidades, ou páginas, vão receber a maior parte do tempo do utilizador. Isto não significa que o resto das funcionalidades ou do conteúdo não tem valor, mas sim que algumas funcionalidades e algum conteúdo são mais importantes para a maioria dos utilizadores.
Esta ideia é importante porque te permite focar a tua research naquilo que mais interessa e garantir que estás a proteger estas áreas quando fores rever a experiência de utilizador. Se degradares ou reduzires o impacto daquilo que os utilizadores mais querem de ti, vais perdê-los ao longo do caminho. Por outro lado, se puderes melhorar a experiência destes atributos centrais do teu produto ou serviço, é mais provável que consigas captar novos utilizadores e potenciar a fidelização dos atuais utilizadores.
Mais uma vez, se começares a falar com os utilizadores sobre aquilo que gostavam de ver no que toca a melhorar a experiência, vais ver que o Princípio de Pareto se aplica. A grande maioria dos utilizadores terá, provavelmente, opiniões fortes sobre um pequeno conjunto de melhorias. Não significa que outras melhorias não tenham valor, mas mostra a que melhorias deves dar prioridade.
Isto pode ser muito útil em projetos com prazos apertados ou orçamentos curtos. Focar nas áreas que vão trazer os maiores benefícios à maioria das pessoas é uma estratégia muito sensível para gerir projetos nestas circunstâncias.
Importa deixar uma chamada de atenção: não é porque muitos utilizadores pedem algo que significa que vão dar valor à sua eventual implementação. Não podes usar o Princípio de Pareto para eliminar user research que está a ser feita. Deves usá-lo para focar a tua atenção no que deve ser importante, não no que deve ser garantido.
Vais ver que o Princípio de Pareto também se aplica a outras áreas da tua research. Por exemplo, o apoio ao cliente percebe que a maioria das suas chamadas, emails, etc., está relacionada com um conjunto de problemas simples. Concentrar esforços em resolver estes problemas vai ter um enorme impacto na fatia maior dos teus utilizadores.
Como aplicar o Princípio de Pareto
Sempre que tiveres dados quantitativos, deves conseguir aplicar o Princípio de Pareto. É uma questão de agrupar, simplesmente, esses dados e ver quão grande é a fatia da audiência afetada por cada unidade dos dados.
É importante considerar a dimensão da amostra ao usar o Princípio de Pareto. Deves garantir que a tua research ou análise cobre uma amostra grande o suficiente para que seja estatisticamente relevante. Se baseares, por exemplo, a análise do teu apoio ao cliente em 5 chamadas telefónicas, provavelmente, não terás dados suficientes para aplicar o Princípio de Pareto.
Existe outra questão a que dar atenção: um conjunto de números pode ser mais importante do que outro. Muitas empresas têm alguns clientes que respondem pela maior parte das receitas. Se estás a conduzir análises que vão levar a um processo de tomada de decisão com base no Princípio de Pareto, vais querer dar a estes clientes mais peso do que a outros que não trazem tantos lucros.
Por exemplo, tens 500 chamadas telefónicas e, dessas, 400 estão relacionadas com um problema com a funcionalidade A, 80 com a funcionalidade B e apenas 20 com a funcionalidade C. Em geral, não é difícil perceber que se deve focar os esforços a melhorar a funcionalidade A. Mas se todas as chamadas relacionadas com as funcionalidades B e C são dos clientes que geram mais receitas… Nesse caso, podes querer focar os teus esforços em melhorar as funcionalidades B ou C primeiro.
Deves usar sempre dados no contexto mais abrangente que tiveres disponível e com o Princípio de Pareto não é diferente.
Em resumo
O Princípio de Pareto, ou a regra 80-20, pode ser muito eficaz em ajudar-te a tomar decisões no teu trabalho de UX. Desde a research e analytics até outros temas, como gestão de projeto, sempre que existirem dados que podem ser quantificados existe a possibilidade de aplicares esta regra na escolha das áreas onde vais focar o trabalho e que trazem mais resultados.
Ainda assim, deves ter sempre em atenção a dimensão das amostras e outros tipos de dados que podem anular o Princípio de Pareto, na prática. O princípio é valioso, mas se for mal aplicado pode deturpar em absoluto qualquer estratégia.
Referências adicionais
Na Wikipédia, podes ler sobre a matemática e as múltiplas aplicações do Princípio de Pareto.
A revista Forbes mostra que o Princípio de Pareto pode ser usado para potenciar o crescimento de negócios.
A Pinnacle Management fala de precauções a tomar quando se confia demasiado no Princípio de Pareto.
A Measuring U olha para dados de UX reais e como o Princípio de Pareto se pode aplicar.
Sugestões de formação
A Interaction Design Foundation pode te ajudar aprofundar este tópico. Aproveita a parceria entre a IxDF e o DXD para conseguires aceder a formações especializadas, com alguns dos melhores e mais reconhecidos profissionais da área. Para explorares muito mais a relação do UX com os negócios e as ferramentas que precisas para tirar partido dessa simbiose perfeita, aqui ficam algumas sugestões de formações sobre o tema na plataforma da IxDF.
- Design Thinking: The Ultimate Guide
- User Research – Methods and Best Practices
- Agile Methods for UX Design
- UX Management: Strategy and Tactics
Dossiê temático
Este artigo integra o dossiê “UX é bom para o negócio. Porquê?” uma iniciativa do DXD em conjunto com a Interaction Design Foundation. O dossiê explora essencialmente a relação e o impacto positivo do UX no negócio das empresas. Uma vez por mês o DXD publicará um artigo integrado neste dossiê, utilizando os conteúdos da IxDF e ajudando a plataforma na sua tradução para português. Consulta todos os artigos do dossiê e descobre como o UX pode ajudar os negócios e a economia.
Tradução e revisão © Filipa Moreno
Fotografia © Immo Wegmann (Unsplash)